sábado, 3 de setembro de 2011

Sonoridade Miscigenada



   A música brasileira parece ter redimido o cinema no que diz respeito à identidade nacional. Ao contrário da sétima arte, que ainda não encontrou o caminho para mostrar a cara da terra brasílis, a musicalidade há muito tempo erigiu a espinha  dorsal sonora da Pindorama. Com a típica influência multifacetada, colorida, ampla, profunda e complexa de todas as matizes que compõem o universo que se verbaliza na língua portuguesa, a música de nosso país tem encontrado representantes que a têm levado ao mais sublime nível de exportação e ensinamento por sua excelência. E, se em outros tempos tivemos   Noel Rosa, Carlos Gomes, Ernesto Nazareth, Villa-Lobos, Guerra Peixe, Pixinguinha e tantos outros, a contemporaneidade nos brindou com Chico Buarque, Elomar e o gigantesco Egberto Gismonti - talvez o maior e o mais universal músico brasileiro em atividade.

   Celebrando os trinta anos do Projeto Unimúsica, a UFRGS trouxe a Porto Alegre o sempre esperado Egberto Gismonti para um concerto inédito junto à Orquestra de Câmara Theatro São Pedro. Primeiro de setembro. Salão de atos  lotado por uma plateia um tanto ruidosa entre tossidos e celulares teimosos, essa praga que domina um vivente que abre mão de ouvir uma divindade do calibre de Gismonti por uma necessidade inutilmente cega de ser encontrado onde não deveria ter chegado.

   O concerto foi na íntegra com sua obra. Na primeira parte, duas peças executadas somente pela orquestra sob a batuta do simpático Borges Cunha. (Como a prenunciar a primavera, despidos de outras formalidades, os músicos estavam com roupas coloridas). Na sequência, antes da parte solo e depois com orquestra, uma explanação do  próprio Egberto sobre o processo criativo e toda sua influência a partir de múltiplos elementos que colorem e ao mesmo tempo costuram essa riqueza diversa que compõe e contrapõe a cultura brasileira. A exemplo de tantos estudiosos, Gismonti conhece e por isso traduz e nos devolve um pouco da brasilidade através da música. E a gente se emociona, chora e muito reflete porque acima de tudo se vê refletido no que ali está e se ouve. Tudo é pensado, até o silêncio.

    A alma está vacinada. Se não tive Mozart, Da Vinci ou Michelângelo para referenciar meu presente, a presença do meu tempo está revestida pela música de Egberto Gismonti.

      Bruno Brum Paiva
    


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