quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Mimosas na Floresta


Domingo as vaquinhas se despediram coletivamente de Porto Alegre. Estavam todas juntas no Bourbon, inclusive a do Inter dando uma bela cabeçada na sofrenilda gremista. Foi uma experiência muito louca para a cidade - atos incompreensivos mesclados com muito carinho às vaquinhas. E lá se foram, elas e Paul, que tocou dentro do Beira-Rio para uma vaca de chuteiras ouvi-lo do lado de fora do estádio. Nós estávamos lá, mas na beira do rio. E também do lado de fora.

Bruno Brum Paiva

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O Grito Rouco

Naquela noite tudo parecia estranho, nenhum caminho levava ao sossego. A lua cheia, surgida no crepúsculo, de repente viu-se tragada pelas nuvens da chuva. Chuva é sinônimo de sapos, e o coaxar alegre dos anfíbios povoa musicalmente as trevas no Vale dos Monges, onde estamos. Raquel odeia sapos.
A noite avança rumo a segunda-feira. Todos foram embora, todos os que se propuseram a passar o feriadão de páscoa naquela casa. E nós, ficamos. Por que a coragem, por que a insistência de mais um dia? Aquela noite pôs em xeque o silêncio das anteriores.
A terceira roda do mate inicia o giro quando Raquel dá um pulo da cadeira. A aranha armadeira fez escala em seu ombro antes de pousar no chão, sisuda, encarando-nos com seus ferrões a postos. Gelamos. Os princípios ecologistas foram abafados pelo instinto de sobrevivência, e Protásio primeiro a trucidou para depois perguntar se concordávamos com a subtração do aracnídeo. Não imaginávamos, então, aquela exceção à vida sendo estendida outras cinco vezes, somatizando um terror descomunal nos momentos seguintes. Em seguida, Protásio abre a janela e só não tem seu rosto como alvo certeiro porque a rapidez age em forma de precaução. O animal morre pelejando contra a vassoura que o esmaga, da mesma forma outras duas, que cruzam do quarto para a sala. Vou ao banheiro, acendo a luz e no espelho está outra, mirando-me no reflexo. Quebrar o vidro? Minutos depois, a vassoura assassina disseca seu movimento perpendicular à parede, dando cabo a mais uma guerreira dessa noite sem fim.
A chuva passa e o mate é retomado, temperado pelas mais escabrosas estórias. Hora de dormir, camas no chão, tudo é movimento. Como nas outras noites, Protásio dorme no sótão. O sono vem, meio sestroso, tomando embalo na tensa madrugada. Seu rompimento é brusco, acionando os sentidos de alerta após o berro estremecedor de Protásio. O alvorecer é marcado pelo grito de exorção, fuga, pavor, liberdade ou quem sabe uma sonora saudação junto aos pássaros do outono. Até hoje nunca soubemos.

Bruno Brum Paiva