quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Betânia


Não lembro exatamente quando conheci Betânia e muito menos em que fase da vida passei a usar seus serviços. Mas a paixão foi à primeira vista, mesmo desconhecendo ainda na mais tenra idade quaisquer desses conceitos inventados ou culturalmente estabelecidos. De tudo, até hoje, o que mais me excita em Betânia é o seu cheiro. Quando mergulho em seu interior e transito livremente pelas entrâncias sinto-me novamente criança. Subo, desço, vou para trás, para frente, inquieto, sem saber direito em que ângulo nos encaixamos melhor ou simplesmente deixamos o tempo passar sem compromisso. Ela, cumprindo seus programa de vinte e cinco minutos; eu, degustando cada segundo de uma trajetória que ela traça de olhos fechados. Quanto amor, quanto balanço, quanto tempo de popas e proas num navegar infinito. Quando nasci, Betânia contava com dezesseis anos de estrada e muita água em sua vida. Agora, que já não sou mais guri, é Betânia uma senhora com arranhões, amassos e ranhuras bem lapidados pelo tempo que indubitavelmente a encaminham à aposentadoria. Temo não mais encontrá-la recostada à mesma estação hidroviária em que minha mãe, pesada, mirou aquelas letras vermelhas escritas em forma de arco: Betânia. Foi nessa lancha em que viajei dando reviravoltas na barriga para ser expelido ao mundo na cidade do outro lado do grande rio, Rio Grande.

Até hoje o cheiro mesclado de água salgada e motor em movimento é o melhor de minha relação com Betânia.

Bruno Brum Paiva

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011