segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Bissextas Manias





   O ano bissexto implica zil combinações e comemorações  muitas vezes carentes de uma lógica plausível. Resistir à tentação de um alinhavo no contexto das coincidências é tarefa árdua. Pensei em bissextas outras datas e o que poderia ter feito, encontrando duas em especial: uma carta escrita em Olinda nesse dia em que somente a cada quatro anos posso tomar como referência em relação ao aniversariante amigo do mês subsequente. A missiva trazia relatos e sentimentos muito contextualizados em seu presente ambíguo e ricamente dividido pela multiplicidade brasiliana. 

     A segunda data foi um divisor de águas em minha vida, que foi a saída de Tavares para o mundo justamente´no último dia daquele fevereiro oitentista. Dali, nunca mais fui o mesmo. Crescimento no atrito que a vida por instantes empaca para noutros impulsos retumbar.

      Risos e lágrimas no lacrimejar sorridente da construção perpétua marcada por calendários marcados e marcantes. O próximo bissexto também será olímpico.


                                                              Bruno Brum Paiva
                                                            http://noslemosporai.blogspot.com

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Matilde e o Gravador


     Matilde nasceu com ares de princesa. Queria ser. Acreditava ser. Era. O sonho foi apagado – ou acordado – ao casar-se com um varão um pouco mais bruto que seu pai. Somente quando se tingiu de núpcias pôde perceber que a prematura saída de casa para livrar-se do pai a fez cair nas  mãos de outro algoz: o esposo. E agora? Tocar em frente. Festas,  mulheres e falências, esse foi o palco de sua vida. Com pouco dinheiro e muito papo seu marido cinquentão apaixona-se por uma adolescente e joga-se no  mundo da volúpia.  Matilde, desesperada, compra um gravador para registrar a opinião de amigos e parentes a respeito do rumo que dará ao matrimônio. Não quer mais a cachorra poodle nem jóias raras para continuar inerte. Somente opiniões seguras, daquelas que tudo resolvem para  o outro.  E é por não acreditar quando Lucrécia fala, ao vivo, que por repetidas vezes ouve a fita já gasta por tantas regravações. Daquele retangular objeto vem a solução a partir da voz rouca e do jeito gago de Lucrécia  detalhar o plano. Se Matilde não o terá, tampouco será Morgana a dama de Alonso. Ele, o medonho, habitará para sempre o gelado chão do Jardim da Paz. Matilde quebra em pedacinhos e depois tritura no liquidificador sua preferida taça de cristal, que dará o letal tempero adicionado ao chá preto que todas as noites repousa ao lado da cabeceira. Matilde acorda de sobressalto e com muita sede; no emaranhado dos pesadelos por várias vezes tomou o chá. A xícara amanhece, como sempre, vazia. Alonso dorme serenamente. Ansiosa pelo telefonema de Lucrécia, Matilde desconhece o que a espera.

  
                 Bruno Brum Paiva

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

TEODORO


Pescador. Asmático. Cismado. Morava na Praia da Curva, que ficava próximo à curva da praia. Sempre dizia: 'o mar vai comer a Lagoa, o mar vai emendar na Lagoa'. Não gostava quando lhe diziam que esperança é a última que morre. Sua mulher, Esperança, gozava de boa saúde. Ele, um tanto trôpego e de pouco fôlego, não desejava que Esperança ficasse por último. E a quem tocaria o barco?


Teodoro picava o fumo sem olhar para água e tampouco para as mãos. Mirava o nada, atento apenas às previsões do tempo. Mar de dentro e oceano, água e mar. Talhamar. Na verdade, água e areia. Somente o pó. Solidão. A sentença bate no pensamento que cospe em palavras: tudo vai virar uma coisa só, tudo vai ficar debaixo d’água, areia sob água. Não sei o que será doce nem o que será salgado. Os peixes serão os mesmos, a comida dos peixes será a mesma. E Esperança, onde andará Esperança?


Esperança nasceu sem qualquer motivo para receber esse nome. Sua mãe queria colocar-lhe o nome de Graça, mas achava sem graça. Queria homenagear Auxiliadora, mas na hora de registrar aquela criança magrela falava tanto que acabou confundindo o escrivão. Meses depois, ao fazerem o cadastro para o recebimento do seguro entressafra, foram avisados: a menina não é Auxiliadora, é Esperança. Dona Fermiana achou aquilo uma bênção, um traçado forte, um destino. Quem sabe Esperança seria a esperança de grandes cardumes e poucas tempestades, de muito peixe e pouco vento, de água mansa e sem enchentes. Pobre criança, carregada de toda sorte e apelo de melhora daquela família em crescente desgraça, aos treze anos fora prometida ao velho Teodoro em troca de uma rede. O barco que trouxe o emaranhado de linhas e bóias levou a moça para longe dos olhos de Fermiana, que nutria a esperança de ver a filha dona daquele pesqueiro.


Teodoro. Debilitado a cada crise asmática, insistia com Esperança. Ela tinha de aprender o segredo das águas e seus esconderijos piscosos. A garota sonhava com outros esconderijos, aqueles prometidos pelo primo Patrício antes de ser tragado pela fúria do Atlântico em ressaca. Teodoro desconfiava que ela tinha outro. Esperança não seria a última a morrer. Vendeu-a picada junto aos peixes e gelo encomendados naquela linda manhã de domingo.


Bruno Brum Paiva

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Balneário do Pescador





Rasga uma península sulina
o elétrico do azul
lagoa, e os patos



A Lua
espelho crescente
luz nascente



Melhor poeta,
dias melhores:
Lagoa dos Patos.



            Bruno Brum Paiva


segunda-feira, 1 de setembro de 2014


          A dúvida




É estranho

amar e viver assim,

refletir a justa forma da vida

amando e odiando no mesmo instante.



                          Bruno Brum Paiva





terça-feira, 26 de agosto de 2014

Desejo e Sonho -

Deveria ser permitido voar pelo menos uma vez na vida. Se me fosse permitido voar, mesmo que fosse uma única vez em toda vida, gostaria de fazê-lo ouvindo Villa-Lobos.

                                                             Tina Gonçalves


Essa foi a melhor gravação que encontrei da música que ela mais amava e não por acaso a última que (acredito) ouviu. Só para dizer feliz aniversário!

http://www.youtube.com/watch?v=NxzP1XPCGJE

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Cercania das Águas


Após Salvador, ilha do Morro de São Paulo.
Fotos, depois.
Projeto Solo solando.

       Bruno Brum Paiva